sábado, 21 de dezembro de 2024

«SER POETA» de Florbela Espanca

Florbela Espanca, grande poetisa que viveu com demasiada intensidade o sentimento do Amor.

E que morreu jovem, como uma bela borboleta que esvoaça e desaparece nos ares.

Foi assim a sua passagem pela terra.




SER POETA

Ser Poeta é ser mais alto, é ser maior

Do que os homens! Morder como quem beija!

É ser mendigo e dar como quem seja

Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor

E não saber sequer que se deseja!

É ter cá dentro um astro que flameja,

É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!

Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...

É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...

É seres alma e sangue e vida em mim

E dizê-lo cantando a toda gente!

Florbela Espanca, em "Charneca em Flor"




quinta-feira, 19 de dezembro de 2024

«O Chão que piso»

 


O chão que piso

É o céu da sua casa

Repartimos paredes

Alegrias e tristezas

Conhecemo-nos

Eu, sem esperança

E sem palavras

Ela, força da natureza

Tudo corpo tudo alma

 

Vencemos juntas a dor

Aquela escuridão que mata

O fogo que não se apaga

Aquelas facas na garganta

 

Por fim renasci

De novo o mar

Lisboa e o rio

A luz o calor o frio

O mundo todo

 

Estou viva

Sinto o coração

Teimosamente a bater

Sempre à espera

Dum novo amanhecer.


Maria Isabel



quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

«Uma réstea de sol e de esperança»

 


Uma réstea de sol e de esperança

 

O dia está frio, arrepiado

O céu branco de neve, que não cai ainda…

Mas resta-nos do Verão o esplendor

Nos nossos corações brilha o calor

Por todos os lados em todos os jardins

Até nas ruas mais recônditas

Vermelho verde azul dourado

Dentro e fora de nós

Tu e eu o outono da vida

Os dias escuros frios enevoados

Que brilham de novo

O mesmo sol do verão

Mais sensato mais ameno

Ao longo do dia e da vida

Tudo renasce tudo se renova

Os mesmos gestos as mesmas palavras

Repetem-se indefinidamente

Tudo parece igual mas

Tudo é tão diferente

Tão diferente, tu e nós

Agora seremos diferentes!


Maria Isabel

 


 

segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

«Numa Madrugada Nasci»

 


                                            Santa Cruz


Numa madrugada nasci

Noutra quase morri

Sinto-me viva

Agora

Renasci

O tempo já tem sentido

Os dias as horas

Já sinto o que o corpo me diz

Os bichos as pessoas as plantas as coisas

Tudo faz sentido

Orgulho-me de tudo o que existe

Sol  mar areal

Terra musgo erva água fresca

Sinto-me viva agora

Sou uma árvore

De grande porte

E cresço cada vez mais

Ergo cada vez mais

Os meus braços para o céu.

                                              Maria Isabel




sábado, 14 de dezembro de 2024

«Batem leve levemente...de Augusto Gil

 


Balada de Neve (Augusto Gil)

Batem leve, levemente, como quem chama por mim…
Será chuva? Será gente?
Gente não é certamente e a chuva não bate assim…
É talvez a ventania, mas há pouco há poucochinho,
Nem uma agulha bulia na quieta melancolia
Dos pinheiros do caminho…

Fui ver. A neve caia do azul cinzento do céu,
Branca e leve branca e fria…
Há quanto tempo a não via! E que saudades, Deus meu!
Olho através da vidraça. Pôs tudo da côr do linho.
Passa gente e quando passa,
Os passos imprime e traça na brancura do caminho…

Fico olhando esses sinais da pobre gente que avança,
E noto, por entre os mais, os traços miniaturais
Duns pezitos de criança…E descalcinhos, doridos…
A neve deixa ainda vê-los, primeiro bem definidos
Depois em sulcos compridos, porque não podia erguê-los!…

Que quem já é pecador sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor porque lhes dais tanta dor?!
Porque padecem assim?!…
E uma infinita tristeza, uma funda turbação
Entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na natureza e cai no meu coração. Ah!



sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

«Estou Aqui»

 


Um poema da minha juventude, que fala das angústias desses tempos, em busca de alcançar o que era ainda apenas um sonho.


Estou aqui

 

Estou aqui apenas

Não sei para quê

Cadeira partida

Olhos da vida esquecidos

Pão que não foi comido

Mar sem fim

Lua parada no céu

Dos meus sonhos

Fugindo de mim

Mar imenso e terrível

Porto de abrigo inatingível

Casa sem telha

Portas trancadas

Arcas fechadas

Apenas assim

Estou aqui.

                                       Maria Isabel

 


quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

«Fechemos os olhos» ( ano 2000)

 



Fechemos os olhos

Para não ver nada

Descansemos um pouco

Não vale a pena

Tornar a abri-los

Porque o mar está assustadoramente belo

Um azul tão profundo

O céu em cinzas

Prende-se à terra

Numa faixa branca de algodão

Longe, no horizonte

Tudo assustadoramente belo!

Fechemos os olhos assustados




Descansemos um pouco

Deste mundo e destes homens

Em fogo, em guerra

Corpo e alma em sofrimento

Tanto mal tanta dor

Fechemos os olhos

Para nada ver 

Nada  

Não vale a pena

Tornar a abri-los.




 

quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

O meu moinho da Ericeira





Da Ericeira guardo grandes e belas memórias, de muitos anos aí passados no Parque de Campismo de Mil Regos.



Foi lá que descobri as marés da nossa praia preferida, a da Empa, que com maré vazia descobria os seus rochedos, os seus búzios (havia centenas noutros tempos, a caminharem na água), o grande rochedo furado onde adorava nadar mesmo debaixo do seu arco, as suas conchas e pedrinhas.






E até desta réplica de moinho de vento, que estava à entrada, que eu considero também meu.


 


terça-feira, 10 de dezembro de 2024

«Ao Desconcerto do Mundo» de Luis Vaz de Camões

 No Jardim-Horto de Camões, em Constância.


Ao desconcerto do Mundo


Os bons vi sempre passar
No Mundo graves tormentos;
E pera mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado.
Assim que, só pera mim,
Anda o Mundo concertado.





domingo, 8 de dezembro de 2024

«A Menina com flores» pintado por mim, quando era uma jovem mulher em busca da beleza. Na natureza, na escrita, em tudo no mundo em que vivemos.
Que nem sempre foi belo, nem será nunca.



Quem sou?

Sou mulher ou sou menina...
Sou flor ou sou sereia...
Sou fada ou sou bruxa.
Sou linda ou sou feia...
Sou quem erra quando busca acertar...
Ou quem acerta quando não quer nem tentar...
Que diz palavras pesadas com a leveza do ar...
Ou palavras amenas com a força de um trator...
Canto a vida e a dor...
Choro e sinto amor...
Sou início, meio e fim..
mas enfim, quem sou?
Sou mulher...

sábado, 7 de dezembro de 2024

«O dia em que nasci...» de Fernando Assis Pacheco (1937-1995)




O dia em que nasci meu pai cantava

versos que inventam os pastores do monte
com palavras de lã fiada fina
cordeiro lírio neve tojo fonte
esta é uma velha história de família
para dizer como ele e eu chegámos
à raiz mais profunda do afecto
da qual nunca jamais nos separámos
nem Deus feito menino teve um pai
que o abraçasse e lhe cantasse assim
desde a primeira hora até ao fim
fui vê-lo ao hospital quando morria
olhos parados num sorriso leve
tojo cordeiro lírio fonte neve

Lisboa
28-XII-93
in «Respiração Assistida»



sexta-feira, 6 de dezembro de 2024

«As três Fadas» - (conto de fadas da região do Algarve)

 Hoje, uma bela fábula da região do Algarve.

 Do Algarve, de que gosto tanto, com todos os seus recantos, praias, costumes e doces maravilhosos.


                                                               teatro de portimão

As três fadas


Era uma vez um casal, João e Francisca, que viviam muito tristes porque não tinham filhos.

Era um grande desgosto para eles. Até que um dia, Francisca resolveu ir ter com o Padre Santo António para se confessar e contar-lhe o seu problema.

O santo disse-lhe:

-Olha, Francisca, leva estas três maçãs para casa, mas atenção: tens que as comer em jejum.

-Está bem, padre. Muito obrigada – respondeu a Francisca, toda feliz da vida.

Quando chegou a casa, pôs as três maçãs sobre a cómoda e foi fazer o almoço.

O João, quando chegou a casa para almoçar, viu logo as maçãs e, como era muito glutão, comeu-as todas.

- Ah, homem, o que foste fazer! – disse Francisca toda aflita.

E foi a correr ter com o santo outra vez, que lhe disse apenas:

-Pois então, já que ele comeu as maçãs, ele é que vai ter a criança e passar por todos os trabalhos do parto.

Francisca foi contar ao marido o que o padre tinha dito.

-Pode lá ser! Nunca um homem teve uma criança…Ah! Ah! Ah! Isso é impossível – respondeu incrédulo o João .

Mas os tempos passaram, a barriga de João foi crescendo e, chegado o momento do parto, ele começou a gritar.

-Ai, quem me acode! Ai, que eu morro!

A mulher foi a correr chamar o médico, que lhe abriu a barriga  e tirou de lá a criança.

João, estava tão desesperado e fora de si, que mandou deitar[P  a criança nos montes, não a  querendo ver mais.

Foi então que uma águia, que tinha descido do alto das escarpas à procura de alimento, viu o bebé abandonado  e levou-o no bico para o seu ninho. Lá a criança foi crescendo, alimentada com o leite que a águia ia tirar às vacas que pastavam nos montes, agasalhando-a com umas roupitas que surripiava dos estendais. Quando já não cabia no ninho, fez-lhe uma casota de palha e com pauzinhos, onde a pobre criança foi crescendo e se tornou numa formosa rapariga.




Certo dia, apareceu por aquelas montanhas um príncipe, que andava à caça. Quando viu aquela jovem tão bela, perguntou-lhe:

-Queres vir comigo para o meu palácio? Não podes continuar a viver aqui para sempre…

Ela respondeu logo que sim. Mas, quando ia a entrar para a carruagem do príncipe, apareceu a águia para a impedir.

-Não vás embora! Fica aqui comigo! – dizia a águia, desesperada, lutando contra o príncipe.

No meio da luta e da confusão, deu-se uma desgraça: a águia tirou um olho à menina com uma bicada, ficando esta com aquele defeito e aquela marca para sempre.

Mas o príncipe tinha-se apaixonado por ela logo que a viu e não deixou de gostar dela por isso. Levou-a consigo até ao palácio e escondeu-a no seu quarto.

Como o príncipe passava muito tempo fechado no seu quarto, a rainha começou a desconfiar.

-O que será que se passa, para ele nunca sair do quarto? Tenho de arranjar uma maneira de o fazer sair e descobrir o que está lá dentro!

A rainha mandou então preparar uma grande caçada. O príncipe foi acompanhado de todos os seus fidalgos e por lá andaram durante vários dias.

A rainha pôde entrar finalmente no quarto do filho, por uma porta secreta, que só ela conhecia. Descobriu logo a menina e disse-lhe:

- Com que então és tu que trazes o meu filho encantado!? Eu logo vi que aqui havia mistério! Anda comigo que te vou mostrar os palácios e o jardim.

A pobre da moça lá foi com a rainha, vendo tudo o que esta lhe mostrava. Quando chegaram ao jardim, a rainha levou-a para perto dum poço muito fundo, deu-lhe um forte empurrão e ela caiu lá dentro.

Quando o príncipe chegou da caça, a rainha foi logo ter com ele e disse-lhe:

-Aquela rapariga que estava fechada no teu quarto, assim que apanhou a porta aberta, desatou a correr e ninguém  a conseguiu apanhar.

De noite, andavam três fadas por ali e, ao ouvirem uns gemidos, aproximaram-se do poço.

-Que será isto? Estão a ouvir o mesmo que eu?

-Parecem gemidos de mulher…

E lá foram espreitar à   poço, viram a rapariga lá no fundo e uma das fadas disse:

-Eu te fado que saias desse poço já e que sejas a menina mais perfeita do mundo!

E a segunda fada:

-Eu te fado que tenhas uma tesourinha de prata, para cortares a língua a quem te perguntar as coisas duas vezes.

E a terceira fada:

-E eu te fado que tenhas um palácio em frente do palácio da rainha, velhinho por fora, mas muito bonito por dentro, todo em ouro e prata.

E assim foi.

 No dia seguinte, todos no paço ficaram muito admirados por verem aquele antigo palácio aparecer assim, do nada. A rainha então ficou intrigadíssima e enviou um velho criado saber que palácio era aquele e quem lá morava.

O velho criado entrou no velho palácio e ficou maravilhado com o que viu lá dentro. Apareceu-lhe uma bela jovem muito bem vestida, a quem perguntou:

- Sua majestade, a Rainha, enviou-me aqui para saber que palácio é este e quem o habita.

A jovem respondeu assim:

 

Diga a Sua Majestade

Que minha mãe me desejou,

Que foi meu pai que me teve

E nas silvas me deitou;

Uma águia me criou.

 

Na caça o príncipe me achou,

A rainha ao poço me deitou;

Mas três fadas me fadaram,

Para aqui me trouxeram

E eu daqui me não vou.

 

O velho criado, perante aquela complicada história, não percebeu bem e pediu para ela repetir.

A jovem disse então:

-Desanda, tesourinha.

A língua do velho criado caiu logo naquele instante. Voltou para o palácio e só conseguia dizer:

-Ló-ló-ró…ló-ló-ró…

A rainha mandou lá outro criado, mas também lhe aconteceu o mesmo.

Por fim, foi lá o príncipe e, quando ouviu aqueles versos, reconheceu logo a jovem por quem se tinha enamorado.

Foi a correr contar tudo à rainha, que quis ir lá também ver se era verdade.

Depois de se certificar que era mesmo verdade, autorizou o casamento dos dois, que ficaram muito felizes.

  (conto de fadas da região do Algarve)

 

 

 


 [

quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

Antiga Feira Popular

 


A antiga Feira Popular de Lisboa fechou há duas décadas, com a promessa de ser feita uma outra .

Até hoje, não se fez nada.

Será que os políticos se esqueceram mais uma vez?


O que está previsto:

Megaprojecto imobiliário, com um bombom de espaço verde, para enganar os lisboetas.

Tudo o que Lisboa não precisa, mais arranha-céus, mais poluição, mais espaços para gente rica e milionários (até ver...).
Modernidade sim, mas sem esquecer o espaço de diversão e convívio dos lisboetas e portugueses em geral.
Sem esquecer o passado( os políticos são muito esquecidos 😉

quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

«Quando eu Morrer» de Fausto

 RELEMBRANDO FAUSTO, QUE MORREU EM JULHO DE 2024.

Um grande cantor e músico, uma grande voz e  acima de tudo um grande homem.




terça-feira, 3 de dezembro de 2024

Estátua de José Pedro dos «Xutos» nos Olivais

 No Bairo onde também cresci e vivi até aos 20 anos.

Um bonito bairro com muitos espaços verdes, que convidavam ao descanso e ao sossego. Como por exemplo o parque em frente da casa dos meus pais e o Vale do Silêncio, de que guardo boas recordações.

José Pedro Amaro dos Santos Reis, conhecido por todos como Zé Pedro, morreu em 2017, aos 61 anos, em casa. Antes disso, teve muito para contar, como a fundação de uma das mais populares bandas de rock portuguesas de sempre, os Xutos & Pontapés. No sábado, 30 de Novembro, o guitarrista foi homenageado pela Câmara Municipal de Lisboa (CML) e pela Junta de Freguesia dos Olivais (JFO), ganhando uma escultura num jardim que agora tem o seu nome.




segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

 



Relembrar José Afonso, é preciso

Canto Jovem (Moço)

Somos filhos da madrugada
Pelas praias do mar nos vamos
À procura de quem nos traga
Verde oliva de flor no ramo
Navegámos de vaga em vaga
Não soubemos de dor nem mágoa
Pelas praias do mar nos vamos
À procura da manhã clara

Lá do cimo duma montanha
Acendemos uma fogueira
Para não se apagar a chama
Que dá vida na noite inteira
Mensageira pomba chamada
Companheira da madrugada
Quando a noite vier que venha
Lá do cimo duma montanha

Onde o vento cortou amarras
Largaremos pela noite fora
Onde há sempre uma boa estrela
Noite e dia ao romper da aurora
Vira a proa minha galera
Que a vitória já não espera
Fresca brisa moira encantada
Vira a proa da minha barca.