Pseudónimo de Júlio Maria dos Reis Pereira, irmão do poeta José Régio, Saúl Dias nasceu em Vila do Conde em 1902. Formou-se em Engenharia Civil, frequentou a Escola de Belas-Artes do Porto, realizando em Portugal várias exposições individuais de pintura e desenho. Colaborou artisticamente em diversas revistas e jornais, nomeadamente a Presença,a cujo grupo pertenceu como poeta e como artista plástico.
A sua poesia caracteriza-se por uma grande delicadeza e pureza de expressão.
Achei muito curioso este poema, por me identificar com ele: também eu tive que eliminar da minha vida, progressivamente, o café, o fumo, e muitas outras coisas. Mas há sempre muito que fica ainda para viver, para além destes pequenos deleites da vida.
Álcool, Fumo e Café
Não mais o álcool,
não mais o fumo,
de azulado rumo,
nem o café.
Resta-me a fé
num áureo aprumo.
Não me consumo.
Sei como é.
Os nervos cansam
e vão partir-se.
A voz de Circe
ouço-a ainda...
E, mais mais linda,
ainda me chama
e, embora lama,
quero-lhe ainda.
Mas quero quietos
os meus sentidos,
comprometidos
em ascensões.
As sensações
hei-de chamá-las,
purificá-las
com comunhões.
Resto sedento,
desalentado...
Quem a meu lado
no funeral?
Negro portal
hei-de quebrá-lo.
Cantar de galo
sobre o coval.
..................
De qualquer forma
sigo o meu rumo,
num áureo aprumo,
cheio de fé.
Sem o café,
sem o tabaco, cortar o opaco
sei com é.
in «Tanto»