António Pedro da Costa nasceu em 1909, em Cabo Verde. Veio para Lisboa estudar Direito e Letras, tendo vivido depois em vários países. Viveu os últinos anos da sua vida em Moledo do Minho, onde morreu em 1966.
Esteve ligado ao teatro, tendo sido director, encenador e professor de teatro no Porto. A sua acção encontra-se ligada a todos os movimentos artísticos de vanguarda e foi um dos principais animadores e renovadores do nosso teatro.
Foi também pintor e escritor, pertenceu ao Movimento Surrealista de Londres e foi à sua volta que se formou o primeiro grupo deste movimento, em Portugal.
Quero dar a conhecer aqui a sua faceta de escritor, ou melhor, a de poeta. A sua poesia vai evoluindo de uma lírica simplicidade para um barroquismo cheio de gosto pelo concreto, onde os temas do Minho raiano e marítimo e o surrealismo se foram cruzando cada vez mais.
Escolhi, assim, o poema intitulado
Maresia
Neste mar à minha frente
O sol repoisa e os nossos olhos dormem...
-Caem saudades mortas como chuva miúda,
Ou sobem, trémulas, como o vapor das algas,
Ou ficam, extáticas como um bafo de areia,
Calmas, sobre a paisagem,
Como um véu de cambraia deixado...
Não sei se é o calor das algas,
Se é o bafo de areia que baila,
Ou se é a chuva miúda que cai neste dia de sol
Como um véu de cambraia deixado,
Sei que me lembram os signos do zodíaco
Em boa caligrafia,
Uns signos como nem sequer eu tinha imaginado!...
E este calor que dimana da terra e nos confunde com ela,
Nos aquece as pernas de encontro à areia, numa vida exterior
Com mais sangue que a nossa e, sobretudo, cheia
Duma inconsciência que se não parece com nada,
Esta respiração pausada como as ondas, de trás para diante
Fazendo, lentas, e desfazendo
A mesma curva humaníssima e sensível,
Faz-me escrever, devagar, e com letra de menino pequeno
Sobre o chão acamado, esta palavra
AMOR
(in Aventura, nº3)