Havia um comerciante libanês que tinha uma loja no «mato» e o armazém cheio de mancarra e a mancarra determinava a vida e a morte dos homens, no «mato».
Pede amendoins, «Oui, des cacauettes». Não há. Pensando bem, ele nem sequer gostava muito de mancarra-amendoins-cacahuettes, ele apenas sente vontade de se ouvir numa alusão vaga à importância dessa coisa sem importância que é algures o pão e a fome.
Ah, como a memória está ainda fresca!
Agora ele não quer esquecer o que são a Fé eo Império ou em que é que se transformaram ou, afinal, que não se transformaram senão naquilo que sempre foram.
Álvaro Guerra, Noite de cães, in O Disfarce
Deixando de lado as referências político-sociais do excerto deste imprescindível livro de Álvaro Guerra, centrei-me unicamente na alusão aos amendoins que na Guiné dos anos da Guerra Colonial era conhecida por «mancarra» (não sei se se mantém esta magnífica denominação) e ao facto de um libanês ter uma loja no meio do mato e no meio da guerra.
Já tinha lido algumas obras sobre as excentricidades e os episódios «anedóticos» desta guerra, que devem acontecer em todas as guerras, mas estes dois factos deixaram-me ainda surpreendida.
O homem é capaz de tudo em situações últimas de sobrevivência,sem dúvida. Aqui fica mais um exemplo.