O livro mágico
Muitas
pessoas que se acham sábias dizem que já não há mais nenhuma história para
contar!
Que todas as histórias já foram contadas, todas as ideias já
foram exploradas, inventadas e reinventadas.
Pois eu, que não sou sábia, digo-vos que não!
Que tudo está por contar ainda!
Tudo o que está a acontecer agora no mundo e que vai
acontecer amanhã, depois de amanhã, nos próximos dias, meses, anos,
séculos…nunca ninguém contou, pois não?
Pode ser parecido com o que já aconteceu, mas igual igual não
é. Nada acontece exatamente como antes aconteceu, igualzinho, sem tirar nem
pôr! As pessoas são diferentes umas das outras, os locais também, as
circunstâncias são outras…
Por isso, há ainda mil milhões de histórias por contar!
Ainda bem, pois eu queria contar-vos uma agora. Está a
apetecer-me tanto! Era uma chatice se não pudesse fazê-lo.
A história do livro mágico!
Não há livros mágicos? Só se nós não quisermos! Mas não vou
argumentar mais com os sábios deste mudo, estejam descansados!
O Pedro tinha um livro grande, muito grande e cheio de
palavras que ele estava farto de ler. Olhava e tornava a olhar para aquelas
linhas muito direitinhas, cheias de abelhinhas que zumbiam aos seus ouvidos.
ZUm-zum-zum zum-zum-zum zum-zum-zum …
Mas ele não percebia grande coisa daquela história! Sabia ler
sim, sabia juntar as letras e formar as palavras, mas não percebia o sentido de
muitas delas.
«Que palavras tão complicadas, porque é que os adultos
escrevem assim?»
Ele não sabia o que queria dizer um monarca.
E o que seria um jardim
botânico? E uma acácia?
E tantas outras coisas de que ele nunca ouvira falar.
Mas dava-lhe uma preguiça terrível e não ia ver o que queriam
dizer as tais palavras no dicionário.
«Ná, isso dá muito trabalho! Tenho mais que fazer!».
E lá vinham de novo as abelhinhas que zumbiam zumbiam na sua cabeça.
ZUm-zum-zum
zum-zum-zum zum-zum-zum …
Ainda por cima, toda a gente lá em casa lhe perguntava:
«Estás a gostar do livro?»
«É giro, esse livro?»
«Emprestas-me depois esse livro?»
«Esse livro deve ser muito interessante!»
E ele Nada, não
conseguia dizer Nada!
Ficava mudo e encabulado! Nem sabia bem o que dizer…
«Hã,hã.. sim sim… é muito giro».
Até que um dia o livro grande do Pedro resolveu dar-lhe uma
ajudinha. Estava farto de o ver fazer aquelas figuras, pediu ao autor que o
tinha escrito licença para fazer uma magia, o autor, que adorava magias,
deu-lhe logo as licenças todas e ele tornou-se num livro mágico.
Ah!!! Agora já sabem o segredo: se as pessoas que escrevem os
livros quiserem muito muito muito, e acreditarem muito muito muito nisso, os
livros podem ser mágicos!!!
Mas o Pedro não sabia de nada, claro! Ia ser tudo uma imensa
surpresa para ele!!
Certo dia em que ele estava mais uma vez intrigado a olhar
para as letras que formavam palavras, que por sua vez formavam frases, que por
sua vez formavam parágrafos, que por sua vez formavam a história, uma das abelhinhas soltou-se do texto alegremente e
pôs-se a voar à sua volta.
Voou, voou, primeiro à volta dele, depois à volta do quarto
do Pedro, como que à procura de qualquer coisa.
-Que é que procuras? Quem és tu?
-Sou a letra L. Não se está mesmo a ver que sou um L? – disse
a letra L irritada.
Pedro olhou para dentro do livro e reparou que …tinham
desaparecido todas as letras L das frases, página após página.
O rosto dele estava branco de espanto:
-Então as letras podem sair do livro e voar?
-Claro que sim, as letras têm o poder de voar e de nos
levarem com elas por esse mundo fora. Basta que haja um leitor.
Logo de seguida, começaram a saltar do livro todas as outras
letras, quer dizer, as outra abelhas, muito amarelinhas com riscas pretas.
E lá ia o M, depois o A, e mais o Z, e depois o E… Todas as
letras saíam do livro e davam voltas e reviravoltas
Até que o quarto do Pedro se transformou numa espécie de
colmeia, com um zumbido infernal.
ZUm-zum-zum
zum-zum-zum zum-zum-zum …
ZUm-zum-zum
zum-zum-zum zum-zum-zum …
«Vem, anda, vem passear, vem sonhar, vem, anda, vem passear,
vem sonhar…» diziam todas elas, no meio dos zumbidos
Pedro nem acreditava no que estava a acontecer, quando, de
repente, olhou para os seus ombros e…também ele tinha uma asas, lindas,
transparentes.
E partiram todos pela janela do quarto do Pedro, as letras,
ou seja, as abelhas à frente e o Pedro atrás, formando um enorme enxame.