Mouraria
Por aquele misterioso Beco das Flores
Bem escondido dos deuses e dos homens
Tudo é segredo, nada acontece
Para além do sol que pinta os muros brancos
Um gato preto que se espreguiça
Um pardal que esvoaça no céu sem cor
Alguém que espreita à janela sorrateiramente
Ou um velho trôpego que se dirige
À tasca da esquina, lentamente
Para expulsar os seus fantasmas, as suas dores…
É por aquele misterioso Beco
Que passo um dia e fico cativa.
Onde no Inverno os dias são noites
E as noites dias, com fados e guitarradas
Apenas o silêncio escorre pelas paredes
Nada acontece de visível
Para além do frio e da chuva
E da passagem da moura cativa.
O sol deixa de brilhar
O gato de se espreguiçar
O pardal de esvoaçar
Ninguém na janela a acenar
Nem novo nem velho
Na tasca da esquina bebe
O sino da igreja emudece
Nada acontece de plausível…
Apenas o lento e monótono girar do universo
Que é tudo e é nada
No quieto e mudo Beco das Flores
Que me transforma em moura encantada.
Isabel del Toro Gomes
Isabel del Toro Gomes
Beco da Achada, Mouraria
A poesia de tipo narrativa recorre frequentemente a processos anti-poéticos...
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