sábado, 8 de junho de 2013

«Superfícies vegetais» de Isabel del Toro Gomes





Uma bola de verdura
Não dá para jogar
Mas é muito melhor
Porque dá para olhar 
E para os pássaros
Esconderem os seus ninhos.



A garra que lança poderosa
Os seus múltiplos dedos
Em direção aos céus
Como quem assusta os medos.


Requiem para uma árvore
 


Aqui jaz tristemente abandonada
A árvore maior, a mãe natureza
Que a tanta mudança assistiu
Os tempos passaram
As secas, as lutas, as ceifas
Até que a subida das águas desejadas
Do lago imenso a mataram.




Pequena, bonita e colorida
Longas câmpanulas lilases
E no entanto
Destilam um veneno mortal
Mistério deste mundo vegetal.




Alguém neste banco irá sentar-se
Não se sabe quem
Para simplesmente descansar 
Dormir ou até sonhar
Na sua sombra refrescante
Em devaneios do além.



sexta-feira, 7 de junho de 2013





Mia Couto, ou melhor António Emílio, escritor moçambicano, recebeu o Prémio Camões este ano, 2013, o maior prémio da literatura lusófona, pelo conjunto da sua obra.
Mais do que merecido! E todos nós, portugueses, nos congratulamos com isso, porque gostamos dos seus livros, escritos numa língua portuguesa reinventada e recriada não só pela sua imensa e variada  experiência de vida, como também pela sua capacidade de a transmitir a todos.
A sua frase Todo o Homem é uma raça tornou-se numa epígrafe e foi adoptada por todos que acham que a condição e o estatuto da pessoa não podem ser atribuídos em função da aparência exterior, e que se batem pelo reconhecimento da igualdade biológica e de direitos.

O genoma não tem raça.

Esta foi a frase proclamada em 13 de Fevereiro de 2001, no início deste século que se deseja diferente do catastrófico século XX, que se pretende sem preconceitos de espécie alguma.
Perante o tempo de instabilidade que se vive em todo o mundo, e o ataque das forças predadoras dos sistemas financeiros e capitalistas, em que cada um procura sobreviver o melhor que pode, ou roubar o máximo possível, segundo o caso, esperemos que estas frases não se tornem míticas, bem como os Objectivos do Milénio, já esquecidos por muitos, com toda a certeza.

Chegada

Chegas,
sóbria e sombria,
e desocupas em mim
a tua própria sombra.

Agora és a minha própria voz:
nenhum silêncio nos pode calar.

Falas e acaba o tempo.

E eu escuto-te
apenas quando te lembro.

 


Mia Couto, Poema Inédito(vidé Jornal de Letras de 12/6/2013)


quinta-feira, 6 de junho de 2013

Fernando Pessoa



Deus Quer, O Homem Sonha, a Obra Nasce

                        Fernando Pessoa




Caricatura de Fernando Pessoa por André Carrilho

domingo, 2 de junho de 2013

Sevilha




Dos meus antepassados de Sevilha, apenas conheci o meu avô Mariano, que eu adorava e que me chamava «joinha». Foi também meu padrinho. Ficou viúvo muito cedo, a minha avó morreu aos 33 anos. Era um pai extremado, vivendo sempre com a sua filha (minha mãe) e dando-lhe todo o amor e carinho que conseguia, para colmatar a falta que uma mãe faz, como ele próprio sabia.




Era uma doce e terna criatura, e como sevilhano de gema, gostava de  touradas. Nisso não o acompanhava. Sua mãe, Dolores, morreu de parto, o pai um ano depois, dizem que por ter ficado no cemitério tempo de mais ao sol, em frente ao túmulo dela. 



Meu avô Mariano foi compensado de tanta desventura com um novo amor encontrado numa mulher do povo, trabalhadora e inteligentíssima, que começou por servir lá em casa: a Tatão   
(diminutivo de Conceição). Esta também ficou no meu coração, para sempre.

Da breve vida dos meus bisavós sevilhanos não me restou nada, nem uma foto. Terão passeado e namorado pelo magnífico Parque Maria Luisa, deixado lá a marca dos seus passos felizes naquele momento. É estranho olhar estas imagens paradisíacas e pensar que aqui começou uma parte da minha família. E sentir saudades do que nunca se conheceu. 
E tudo tão belo, num mundo cheio de sofrimento e dor.


«Yo fui» de Luis Cernuda

 


Luis Cernuda nasceu em 1921 em Sevilha e morreu no México em 1963.
É mais um dos poetas da Geração 27.


 Yo fui.
Columna ardiente, luna de primavera.
Mar dorado, ojos grandes.

Busqué lo que pensaba;
Pensé, como al amanecer en sueño lánguido,
Lo que pinta el deseo en días adolescentes.


Canté, subí,
Fui luz un día
Arrastrado en la llama.

como un golpe de viento
Que deshace la sombra,
Caí en lo negro,
En en mundo insaciable.

He sido.

                           Luis Cernuda, Donde habite el olvido





sexta-feira, 31 de maio de 2013

Mais um «Pinocchio» de Collodi




 
Uma das grandes vantagens das Feiras de Livros é poder encontrar de tudo um pouco, livros novos e antigos, autores de todo o tipo, para além dos descontos e promoções.


A presença de alfarrabistas na Feira do Livro é uma das mais valias deste evento, pois nem sempre temos tempo para ir à procura deles, em lugares um pouco escondidos por vezes.

Os livros da moda, do momento, esses encontram-se em todo o lado, bem perto de quase toda a gente. 


Este ano, encontrei uma preciosidade, mais um livro do Pinóquio, que foi visto aliás pela minha amiga Ju.


Fiquei toda contente, pois não tive este livro na minha infância, nem o conhecia. Vem com a marca do seu proprietário, que escreveu na 1ª página em branco, a lápis, com letra certinha e com maiúscula na palavra «Pai»:

Deu-me o Pai no dia 25-12-1940.



Tanta coisa está encerrada nesta pequena frase! Tanta história, que agora me pertence por apenas cinco euros!!


quarta-feira, 29 de maio de 2013

«El poeta se acuerda de su vida» de Vicente Aleixandre

Vicente Aleixandre


















Agora, tempo e espaço aos poetas andaluzes de outros tempos, da bela cidade de Sevilha, terra natal de meu avô materno.
Vicente Aleixandre Merlo, nasceu em Sevilha em 1898, e morreu em 1984, em Madrid.
Era um dos poetas da Geração de 27, recebeu o Prémio nacional de Literatura em 1934, foi membro da Academia Real Espanhola a partir de 1949 e obteve o Prémio Nobel da literatura em 1977.

 El poeta se acuerda de su vida

Vivir, dormir, morir: soñar acaso (Hamlet)

Perdonadme: he dormido.
Y dormir no es vivir. Paz a los hombres.
Vivir no es suspirar o presentir palabras que aún nos vivan.
Vivir en ellas? Las palabras mueren.
Bellas son al sonar, mas nunca duran.
Así esta noche clara. Ayer cuando la aurora,
o cuando el día cumplido estira el rayo
final, y da en tu rostro acaso.
Con un pincel de luz cierra tus ojos.
Duerme.
La noche es larga, pero ya ha passado.


              Vicente Aleixandre , Poemas de la consumación