domingo, 14 de julho de 2013

«Elogio da Dialética» de Bertolt Brecht


Em todos os tempos assim foi e assim será. 
Brecht não nos dá conselhos, não nos avisa, não nos força a nada.
Brecht aponta para a realidade que será nossa em breve, um qualquer dia das nossas vidas, se não desistirmos.

Bertolt Brecht (1898/1956)

Elogio da Dialética
(tradução de Arnaldo Saraiva e Sylvie Deswarte)

A injustiça avança hoje a passo firme.
Os tiranos fazem planos para dez mil anos.
 O poder apregoa: as coisas continuarão a ser como são.
Nenhuma voz além da dos que mandam.
E em todos os mercados proclama a exploração: isto é apenas
                                                                                   o meu começo. 
Mas entre os oprimidos muitos há que agora dizem:
Aquilo que nós queremos nunca mais o alcançaremos.

Quem ainda está vivo nunca diga: nunca.
O que é seguro não é seguro.
As coisas não continuarão a ser como são.
Depois de falarem os dominantes
Falarão os dominados.
Quem pois ousa dizer: nunca? 
De quem depende que a opressão prossiga? De nós.
De quem depende que ela acabe? Também de nós.
O que é esmagado, que se levante!
O que está perdido, lute!
O que sabe ao que se chegou, que há aí que o retenha?
Porque os vencidos de hoje são os vencedores de amanhã.
E nunca será: ainda hoje.

 

  

sexta-feira, 12 de julho de 2013

«Para ser grande, sê inteiro: nada» de Ricardo Reis (heterónimo de Fernando Pessoa)



Que bem que estes versos se aplicavam, com certeza, aos tempos em que viveu Fernando Pessoa, e que bem que se aplicam a todos os tempos!
Versos como estes, intemporais e universais, só os grandes poetas os sabem fazer.


Para ser grande, sê inteiro: nada

Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.

                                                                       Ricardo Reis

«Verão» de Eugénio de Andrade






 Mais um poema de Eugénio de Andrade, de grande beleza porque de grande singeleza, que vem mesmo a propósito.
Calor e sol tem havido muito, caracóis é que já não se vêem como dantes, nos campos. 
Será por os terem comido todos?

Verão
Caracol, caracol,
onde vais com tanto sol?
Vou à loja do senhor Adão
comprar um girassol;
com tanto sol
Ninguém aguenta o verão.
Adeus, adeus, caracol,
tens razão,
sem guarda-sol
ninguém aguenta este sol.


                                                                    Eugénio de Andrade



quarta-feira, 10 de julho de 2013

Rua dos Sapateiros - Lisboa


Rua dos sapateiros - Lisboa


 
Um dos meus passatempos preferidos é ir à descoberta de Lisboa, vadiar pelas ruas da minha cidade natal, que me traz sempre motivos de admiração e de fascínio: como é que eu ainda não conhecia isto (ou já me tinha esquecido)?
A rua dos Sapateiros, onde já tinha passado várias vezes, é uma rua cheia de História e de estórias  para contar. Situada na Baixa lisboeta, hoje é uma rua quase escondida, à sombra das iluminadas e turísticas ruas do Ouro, da Prata, etc.
 
Começando pelo lado do Rossio, ou Praça D. Pedro IV, entra-se por um pequeno Arco, intitulado Arco do Bandeira, em que possivelmente pouca gente repara, distraído com a beleza e grandiosidade do Rossio, ou com a Tendinha, ali mesmo ao lado do Arco, onde se pode degustar uma saborosa ginginha.
 
 
 Construído no final do séc. XVIII, segundo um projeto de Manuel Reinaldo dos Santos, foi erguido a expensas de Pires Bandeira, de que recebeu o nome. O arco pretendia copiar um outro existente no lado oposto da Praça, onde se encontra hoje o Teatro Nacional. É considerado uma das mais belas peças da arquitetura pombalina.
 

 

Entrando pelo Arco para a Rua dos Sapateiros, deparamos com uma obra magnífica, O Animatógrafo do Rossio, hoje com fins bem diferentes dos originais. Pena não se poder visitar por dentro e que uma entidade qualquer não o possa adquirir para o colocar ao serviço da população em geral e cinéfila, em particular.


Continuando pela rua abaixo, do lado direito encontramos um restaurante com história, hoje desconhecida pela maioria das pessoas. Aí se sentou muitas vezes, Fernando Pessoa, para almoçar ou jantar. Trata-se da Adega da Mó.
 
Um pouco mais à frente, também do lado direito de quem desce, encontramos A Camponeza, outro estabelecimento cheio de cultura e de história. É um dos exemplares de Arte Nova mais magníficos em Lisboa, foi bem restaurado e aberto há cerca de uma ano, muito agradável para se tomar um chá e um croissant ou um bolo. Merecia ser mais publicitado.


 


Aqui fica o convite para visitarem a Rua dos Sapateiros, para irem ao encontro da Lisboa de hoje e de sempre, onde encontrarão  estes e ainda outros locais admiráveis, que por vezes tanto procuramos e não encontramos.






sábado, 6 de julho de 2013

«Nós» de Cesário Verde




Cesário Verde (1855-1886)

Considerado por muitos um dos maiores poetas portugueses, embora tenha sido arrebatado pela tuberculose aos 31 anos (a sua irmã e irmão já tinham morrido da mesma causa), deixou uma obra poética de grande beleza e intemporal.
Dessas terríveis doenças que ceifavam vidas a crianças, jovens e pessoas de todas as idades, nos fala ele no poema Nós, enquanto ainda pensava que se tinham salvado na fuga. 
Ironias do destino...

Diz sobre ele Alberto Caeiro, nos seus Poemas Completos:

Ao entardecer, debruçado pela janela,
E sabendo de soslaio que há campos em frente,
Leio até me arderem os olhos
O Livro de Cesário Verde.

Que pena que tenho dele! Era um camponês
Que andava preso em liberdade pela cidade.
........................................................................................................................................................

 

Nós
                        
                                                                 (a A. de S. V.)

Foi quando em dois verões seguidamente a Febre
E o Cólera também andaram na cidade,
Que esta população, com um terror de lebre,
Fugiu da capital como da tempestade.

Ora meu pai, depois das nossas vidas salvas,
(Até então nós só tivéramos sarampo)
Tanto nos viu crescer entre os montões das malvas
Que ele ganhou por isso um grande amor ao campo!

Se acaso o conta, ainda a fronte se lhe enruga:
O que se ouvia sempre era o dobrar dos sinos;
Mesmo no nosso prédio, os outros inquilinos
Morreram todos. Nós salvámo-nos na fuga.
(...........)

                                                            Cesário Verde





domingo, 30 de junho de 2013

Peniche em 2013

Recordações de Peniche em 30 de Junho de 2013



Vista panorâmica de Peniche e Forte de Peniche





Pesca e faróis ao fundo





Peniche vista do Molho Leste








Faróis






Forte de Peniche e Porto






De partida para as Berlengas




Nossa Senhora da Boa Viagem, Padroeira dos pescadores





Pôr do sol, visto do Parque de Campismo



















Um mar de rolotes, no parque de campismo






A mais redonda e pequenina

quarta-feira, 26 de junho de 2013

«O dinheiro de S. Pedro» de Guerra JUnqueiro


Guerra Junqueiro (1850/1923)


Por estas e por outras é que Guerra Junqueiro, que era crente e reconhecia a existência de Deus como alma do universo, foi apelidado de ateu, quer pelo clero, quer por críticos e mexeriqueiros ignorantes, desejosos de caluniar o poeta.
A Velhice do Padre Eterno é, para mim, o seu melhor livro de poesia, donde escolhi este poema satírico.



                                     O Dinheiro de S. Pedro

De tal modo imitou o Papa a singeleza
Do mártir do Calvário,
Que à força de gastar os bens com a pobreza
Tornou-se milionário.

Tu hoje podes ver, ó filho de Maria,
O teu vigário humilde
Conversando na Bolsa em fundos da Turquia
Com o Barão Rothschild.

A cruz da redenção, que deu ao mundo a vida
Por te haver dado a morte,
Tem-na no seu bureau o padre-santo erguida
Sobre uma caixa forte.

E toda essa riqueza imensa, acumulada
Por tantos financeiros,
O que é a economia, ó Deus! foi começada
Só com trinta dinheiros. 


                       Guerra Junqueiro, A Velhice do Padre Eterno