quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

«Azul e verde» de Isabel del Toro Gomes






Azul e verde

Gostava de poder deixar
Os meus olhos aqui
Quando partisse para outro lado

Ficavam assim como estou agora
A olhar os campos, o céu e o mar
Espantados de tanto ver
Ofuscados de tanto ser

Ficariam aqui fixos no céu alto
Perdidos no mar que brilha
De tons verdes em ritmo de azul

E para onde quer que eu fosse
Caminharia às cegas pelas ruas
E só veria as coisas belas
Em fundo azul e verde.

                                                                  Isabel del Toro Gomes 


segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

«Como se faz o poema» de Nuno Júdice

 

COMO SE FAZ O POEMA 

 

Para falarmos do meio de obter o poema,  

a retórica não serve. Trata-se de uma coisa simples, que não

precisa de requintes nem de fórmulas. Apanha-se

uma flor, por exemplo, mas que não seja dessas flores que crescem

no meio do campo, nem das que se vendem nas lojas

ou nos mercados. É uma flor de sílabas, em que as

pétalas são as vogais, e o caule uma consoante. Põe-se

no jarro da estrofe, e deixa-se estar. Para que não morra,

basta um pedaço de primavera na água, que se vai

buscar à imaginação, quando está um dia de chuva,

ou se faz entrar pela janela, quando o ar fresco

da manhã enche o quarto de azul. Então,

a flor confunde-se com o poema, mas ainda não é 

o poema. Para que ele nasça, a flor precisa

de encontrar cores mais naturais do que essas

que a natureza lhe deu. Podem ser as cores do teu 

rosto – a sua brancura, quando o sol vem ter contigo,

ou o fundo dos teus olhos em que todas as cores

da vida se confundem, com o brilho da vida. Depois,

deito essas cores sobre a corola, e vejo-as descerem

para as folhas, como a seiva que corre pelos

veios invisíveis da alma. Posso, então, colher a flor,


e o que tenho na mão é este poema que 

me deste.




                                                                        Nuno Júdice




Para a maioria das coisas da vida a sério, a Retórica não chega. É preciso a acção. E mais alguns elementos secretos.
Um grande e belo poema este, de Nuno Júdice.





                                                         Prímulas ou Primaveras

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

«Mãe...é para ti» de Isabel del Toro Gomes







 Mãe… é para ti

 mãe adorada
Jamais te esquecerei
Finalmente chegou
Ao fim a tua caminhada.

Mas o caminho continua
Não vás tu pensar
Que vais ficar parada,
Que era o que tu não querias
Nem por nada.

Parar, isso nunca
Morrer nem pensar
Isso nunca!
E De modo nenhum
Num fatídico dia treze!

E que frio de rachar
Que nos deixa transidos
De paixão e de dor!

Querida mãe
Jamais te deixarei só
Pelos atalhos do teu sonho
O sonho grande de amar
E ser amada
Da família, da paz e da harmonia
Esse imenso sonho
Que em cada dia te fugia
E em pó no ar se desvanecia…
E quanto tu mais atrás dele sorrias
Mais ele desaparecia…
Tanta fatalidade tanta tristeza!

 mãe
Jamais as tuas longas mãos
poderei apertar
o teu misterioso rosto beijar
o teu resistente corpo abraçar
não te digo adeus , só até logo!

 mãe
Para sempre Continuaremos  
a fazer compras
No lugar aprazado
Lado a lado
Numa imensa e infantil cumplicidade.
Agora está na hora
De irmos lanchar,
Agora é a hora maior:
Um chá dois bolos e uma torrada,
Que extraordinário momento de felicidade!
minha mãe adorada
contigo aprendi quase tudo
que tu fazias questão de me ensinar
mais e sempre mais…
que a vida mais nos tira do que nos dá…
mesmo assim é um pequeno prazer
Mesmo um dever…
Nunca disso esquecerei!

Minha mãe
Pois então, o caminho é para continuar…
Eu tão pequena
E tu à minha espera de braços abertos
Lá ao fundo da dor
À espera de mim
Para dos pesadelos da noite me consolar,
noite escura e longa…

minha mãe
que vida e que noite tão longas…
agora  que caminhas livre
finalmente em liberdade
ficas a saber, agora sim,
que todos te amaram
e jamais te esquecerão.
                                                                                      16 de Janeiro de 2014