sexta-feira, 20 de abril de 2012

«Anatomia dos Mártires» de João Tordo

  

João Tordo é um dos melhores escritores da nova geração, que se tem vindo a afirmar pela sua escrita escorreita, direta, liberta de vícios de linguagem e de forma a que outros novos autores lançam mão para obterem sucesso rápido.
 João Tordo nasceu em Lisboa em 1975. Formou-se em Filosofia e estudou Jornalismo e escrita Criativa em Londres e Nova Iorque. Em 2009 ganhou o Prémio Literário José Saramago com o romance As Três Vidas (2008). Trabalha como cronista, tradutor, guionista e formador em workshops de ficção.
Este seu último romance, Anatomia dos Mártires, é a história de uma obsessão do narrador-jornalista que se transforma em investigação sobre o «mito» de Catarina Eufémia, tentando destrinçar a verdade da lenda, o que se revela uma tarefa quase impossível, passados mais de 50 anos. 
É também uma reflexão sobre a existência dos «Mártires» ao longo da história da humanidade,  que tem como origem a dramática vida e morte de Francis Dumas.

Se existe uma evolução, então toda a evolução é uma catástrofe. Temos hoje menos recursos do que há mil anos; temos hoje menos humanidade do que há mil anos. O mundo é um lugar tão disperso, fragmentado e cruel que um homem como Francis teve de cair do espaço para se fazer ouvir. Em tempos imemoriais as pessoas punham-se em cima duma rocha e os outros escutavam-nas, tão atentamente, com tanta paixão e fé, que assim nasceram quase todas as religiões conhecidas. 
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Evoluímos? Para onde? Para o quê? O homem transformou-se nisto, numa criatura demasiado inteligente para se contentar com telefones ligados a satélites no espaço e demasiado estúpida para ouvir a pessoa que está ao seu lado.

                                   João Tordo, Anatomia dos Mártires
 
 Interrogações demasiado pertinentes, que nos põem a pensar!

quinta-feira, 12 de abril de 2012

«Pedra Filosofal» de António Gedeão

Este é um dos mais belos poemas portugueses de sempre, para mim. E a canção de Manuel Freire uma das mais belas canções portuguesas. Nunca é de mais relembrá-las.

Pedra Filosofal
Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.


Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho alacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
em perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.


In Movimento Perpétuo, 1956

domingo, 8 de abril de 2012

Páscoa de 2012



Para quem acredita que Páscoa é o renascer das cinzas, bem como para os outros, um dia feliz. Pelo menos, podemos tentar.

                                       Em cada madrugada
 
Como  tudo é  prodigioso
E mágico na natureza
Que renasce em cada madrugada
Como tudo me deslumbra
Do nascer ao pôr do sol
Que marca o tempo que passa
Sem darmos por ele passar
Como se fosse uma surpresa
A eternidade dum minuto
Que pode durar séculos
Uma vida inteira que se traduz
Num pequeno nada que se renova
Um minuto de eternidade
Três ou quatro palavras por dizer
Como é tudo prodigioso
E trágico por natureza.

                                                  Isabel del Toro Gomes


 

sexta-feira, 6 de abril de 2012

«Poemas escolhidos» de Jorge Luis Borges



Este livro de «Poemas Escolhidos» é um dos Cadernos de Poesia, editado pela Publicações dom Quixote, em 1971. Portanto uma preciosidade. Não só porque os poemas publicados foram escolhidos pelo próprio autor e incluídos na sua obra Antologia Personal (1ª edição, 1961), como também porque foram traduzidos por Ruy Belo.
Jorge Luis Borges (Buenos Aires, 1899/Genebra, 1986) foi um escritor, poeta, tradutor, crítico literário e ensaísta argentino. 
De ascendência portuguesa e inglesa, estudou na Suíça, viajou pela Espanha, passou por Lisboa em 1921, esteve nos Estados Unidos e em França. De regresso à Argentina, desempenha várias funções: funcionário municipal, professor, tradutor. Depois da queda de Perón, passa a dirigir a Biblioteca Nacional. A cegueira, provocada por uma antiga lesão, já não lhe permite escrever, obrigando-o a ditar.
Intensamente lido e apreciado na América latina, só a partir da atribuição, em 1961, do Prémio Internacional de Literatura, é que se torna conhecido na Europa. A sua obra incide sobre o caos que governa o mundo e os seus livros mais famosos, Ficciones (1944) e O Aleph (1949) são coletâneas de histórias curtas interligadas por temas comuns: sonhos, labirintos, bibliotecas, escritores e livros fictícios, religião e Deus. A sua escrita contribuiu significativamente para o desenvolvimento do género de literatura fantástica.
De todos eles, escolhi a sua «Arte Poética», um valioso contributo para o estudo e conhecimento da Poesia, como forma privilegiada de arte e de expressão, em todos os tempos. E também de luta!

Arte Poética

Olhar o rio que é de tempo e água
E recordar que o tempo é outro rio,
Saber que nos perdemos como o rio
E que os rostos passam como a água.

Sentir que a vigília é outro sono
Que sonha não sonhar e que a morte
Que teme a nossa carne é essa morte
De cada noite, que se chama sono.

Ver no dia ou até no ano um símbolo
Quer dos dias do homem quer dos anos,
Converter a perseguição dos anos
Numa música, um rumor e um símbolo,

Ver só na morte o sono, no ocaso
Um triste ouro, assim é a poesia
Que é imortal e pobre. A poesia
Volta como a aurora e o ocaso.

                                     Arte Poética, in Poemas Escolhidos 
 

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Dia Internacional do Livro Infantil - 2 de abril

 
Hoje, dia 2 de abril, comemora-se o Dia Internacional do Livro Infantil. 
Que seja um dia em que se lembrem as crianças e os livros, pois são eles que as ajudam a crescer e a aprender. Todas as crianças e todos os livros para a infância, sem discriminações.

 

Para assinalar esta data, a DGLB publicou um cartaz da autoria de Yara Kono, vencedora do Prémio Nacional de Ilustração do ano passado.  Como tem sido habitual nos últimos anos, o cartaz será distribuído pelas Bibliotecas Municipais e por algumas livrarias de literatura infantil.

terça-feira, 27 de março de 2012

Dia Mundial do Teatro 2012

 
Hoje festeja-se em todo o mundo o Dia de Teatro.
Em Portugal, no entanto, não é dia para festejos mas sim para protestos, já que a política do atual governo tem sido de sucessivos cortes e de desprezo pela cultura e por todos os que a veiculam, pondo em prática uma política cega de cortes, indiferente a tudo e todos. Se nem a saúde e o ensino escapam, bem como outras áreas indispensáveis ao desenvolvimento do país, não era de esperar outra posição em relação à cultura e a todas as suas formas de expressão. Um grande erro que lhes pode ficar caro, a estes incautos políticos ignorantes do nosso país. Entretanto, é o Presente e o Futuro de todos nós que é posto em causa.

Eis algumas das atividades no país, neste dia:


- O CENA - Sindicato dos Músicos, dos Profissionais do Espetáculo e do Audiovisual-, convocou uma concentração para terça-feira em frente à Assembleia da República, contra "o anúncio do corte de 100 por cento nos apoios anuais e pontuais".
O motivo é “a iminência de uma próxima morte anunciada: a da Direção Geral das Artes”.
Na concentração será feita uma pequena ação performativa acerca da Direção Geral das Artes e da sua atuação, adianta o CENA, que agenda para as 15:00 a concentração "frente à Assembleia da República por ser dentro daquela casa que os partidos do Governo se demitem de discutir Cultura".
 
 

- Também o Teatro Plástico, no Porto, vai realizar nesta terça-feira um «ato teatral público» para assinalar a data e «questionar a atual situação das artes e dos artistas em Portugal face à tentativa de extermínio político em curso e refletir sobre o papel do teatro na vida pública portuguesa». A iniciativa vai decorrer pelas 22h30, junto ao n.º 37 da Rua Doutor Barbosa de Castro, no centro do Porto.

-Assinalando o Dia Mundial do Teatro, a RTP exibe esta noite, às 22h00, um programa especial apresentada por Catarina Furtado e Diogo Infante.
Os cantos e recantos do Teatro D. Maria II acolhem esta homenagem a todos os fazedores de teatro (os que dão a cara e os que trabalham nos bastidores).
Será dada a palavra a alguns dos nossos maiores atores e encenadores: João Mota, Carla Chambel, João Reis, Sandra Faleiro, Adelaide João, Albano Jerónimo, Jorge Silva Melo, Eunice Muñoz, Lia Gama e Luís Miguel Cintra, entre outros.
A RTP não quis deixar de assinalar este dia recorrendo também ao magnífico arquivo onde estão registadas inúmeras peças produzidas pela estação pública desde 1957. 

Curioso é notar que nos tempos da ditadura em Portugal se fazia teatro na RTP e havia programas culturais. Em «democracia», em que se gasta o dinheiro? Em tudo menos na cultura...E não venham com essa da guerra das audiências, que já não convence ninguém!