A imunologista Maria de Sousa, que morreu esta terça-feira aos 81 anos vítima de Covid-19, deixou uma última mensagem, em verso, escrita a 3 de abril, momento em que já se encontrava gravemente doente.
O poema, escrito em inglês, foi divulgado esta quarta-feira numa tradução do médico e poeta João Luís Barreto Guimarães pela editora Quetzal.
A cientista foi uma das primeiras mulheres portuguesas reconhecidas internacionalmente pelas suas descobertas científicas, tendo-se destacado na área da imunologia, nomeadamente na questão da distribuição dos linfócitos.
O último poema de Maria de Sousa, uma emocionante despedida da vida desta grande mulher portuguesa e uma carta do verdadeiro amor que dedicava à ciência e à humanidade.
Carta de amor numa pandemia vírica
Gaitas-de-fole tocadas na Escócia
Tenores cantam das varandas em Itália
 Os mortos não os ouvirão
 E os vivos querem chorar os seus mortos em silêncio
 Quem pretendem animar?
 As crianças?
 Mas as crianças também estão a morrer
 Na minha circunstância
 Posso morrer
 Perguntando-me se vos irei ver de novo
 Mas antes de morrer
 Quero que saibam
 O quanto gosto de vós
 O quanto me preocupo convosco
 O quanto recordo os momentos partilhados e
 queridos
 Momentos então
 Eternidades agora
 Poesia
 Riso
 O sol-pôr
 no mar
 A pena que a gaivota levou à nossa mesa
 Pequeno-almoço
 Botões de punho de oiro
 A magnólia
 O hospital
 Meias pijamas e outras coisas acauteladas
 Tudo momentos então
 Eternidades agora
 Porque posso morrer e vós tereis de viver
 Na vossa vida a esperança da minha duração
Maria de Sousa
 3 de abril de 2020