quinta-feira, 18 de abril de 2013

«Noite de cães» de Álvaro Guerra





Havia um comerciante libanês que tinha uma loja no «mato» e o armazém cheio de mancarra e a mancarra determinava a vida e a morte dos homens, no «mato».

Pede amendoins, «Oui, des cacauettes». Não há. Pensando bem, ele nem sequer gostava muito de mancarra-amendoins-cacahuettes, ele apenas sente vontade de se ouvir numa alusão vaga à importância dessa coisa sem importância que é algures o pão e a fome.
Ah, como a memória está ainda fresca!
Agora ele não quer esquecer o que são a Fé eo Império ou em que é que se transformaram ou, afinal, que não se transformaram senão naquilo que sempre foram.

                 Álvaro Guerra, Noite de cães, in O Disfarce

 

 


Deixando de lado as referências político-sociais do excerto deste imprescindível livro de Álvaro Guerra, centrei-me unicamente na alusão aos amendoins que na Guiné dos anos da Guerra Colonial era conhecida por «mancarra» (não sei se se mantém esta magnífica denominação) e ao facto de um libanês ter uma loja no meio do mato e no meio da guerra.
Já tinha lido algumas obras sobre as excentricidades e os episódios «anedóticos» desta guerra, que devem acontecer em todas as guerras, mas estes dois factos deixaram-me ainda surpreendida.
O homem é capaz de tudo em situações últimas de sobrevivência,sem dúvida. Aqui fica mais um exemplo. 

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Fernando Pessoa


Afinal, a melhor maneira de viajar é sentir.
Sentir tudo de todas as maneiras.
Sentir tudo excessivamente,
Porque todas as coisas são, em verdade, excessivas (...)

                                                             Álvaro de Campos


Pertenço a um género de portugueses que depois de estar a Índia descoberta ficaram sem trabalho.
                                                              Fernando Pessoa



Neste momento em que tanta gente se encontra sem trabalho e em que outros se engordam à custa deles e se aumentam a si próprios descaradamente, ou não se privam de privilégios e mordomias para ajudar o seu país, é pertinente lembrar esta frase de Fernando Pessoa e interrogarmo-nos que outras Índias é que vamos agora descobrir para sair desta crise.
 

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Ericeira- Forte de São Pedro da Ericeira


 Aqui está uma das vantagens de se ler livros: ontem à noite, ao ler o livro de Álvaro Guerra (magnífico escritor), Razões de Coração, Romance de paixões acontecidas em Mafra ocupada pelos franceses no ano de 1808 (magnífico livro e um documento imperdível sobre a invasão francesa por terras de Portugal), descobri o nome e a história do forte da Ericeira, por onde já várias vezes passeei, não sabendo nada sobre ele, pois nada consta no local.
Quando Álvaro Guerra menciona o Forte de Milreus, pus a cabeça a trabalhar e relacionei o nome de Mil Regos (nome do Parque de Campismo da Ericeira), descobrindo «a pólvora»: era este o nome do forte por onde eu tantas vezes passeei. Eureka!



Estas são as informações principais sobre este forte, de longa e interessante história:
 
O Forte de São Pedro da Ericeira, também conhecido como Forte de Mil Regos, Forte de Milreu ou Forte da Ericeira, localiza-se na povoação da Ericeira, no concelho de Mafra, distrito de Lisboa, em Portugal.
É o último remanescente dos poucos fortes erguidos à época da Restauração da Independência, para defesa daquele trecho do litoral. Destinava-se a controlar o acesso marítimo à Ericeira pelo setor norte e, ao mesmo tempo, prevenir qualquer tentativa de desembarque na baía vizinha, formada pela praia de Ribeira de Ilhas.
Em 1735, o forte contava com sete peças de artilharia. 


Danificado pelas fortes intempéries registadas na região em 1751, procedeu-se à reconstrução de alguns elementos estruturais, cuja estabilidade foi seriamente agravada pelo terramoto de 1755, entrando o forte em processo de ruína.

 No início do século XIX a 3 de Janeiro de 1819, o governador do forte e a Câmara solicitaram auxílio ao soberano, visando a reconstrução do cais, desmoronado por ação do mar.

No contexto da Guerra Civil Portuguesa (1828-1834), foi reparado entre 1831 e 1832, sendo utilizado pelas forças miguelistas. Entretanto, em meados do século recaiu outra vez em abandono, levando a que por requerimento endereçado em 1871 ao Ministro da Guerra, fosse solicitada a utilização de algumas das suas lajes no restauro e construção dos anexos da igreja de São Pedro da Ericeira, o que foi prontamente anuído, enquanto que, na década de 1880, foi recolhida a artilharia remanescente.



Em 1891, a Guarda Fiscal instalou-se nas dependências do Forte da Ericeira e na antiga Casa do Governador, anexa ao mesmo, utilizada à época como escola para meninas. Nesse período, em 1896, tendo desabado parte da muralha do forte, o orçamento para os reparos devidos elevou-se a 35 contos de réis.

No início do século XX, o antigo forte foi reequipado de artilharia por determinação de D. Manuel II (1908-1910).
Novamente abandonado, em 1940, foi reedificada a muralha subjacente, passando o imóvel a ser tutelado pelo Ministério das Finanças. Nesse período, em 1945, foram feitos projetos pela Junta de Turismo da Ericeira, contemplando a adaptação do antigo forte a miradouro, a instalação de uma casa de chá e o estabelecimento de uma pousada.



Classificado como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto 129/77, publicado em 29 de Setembro de 1977, o forte apenas foi objeto de conservação na década de 1980, quando a DGEMN procedeu à reconstrução da muralha e do pavimento do terraço.
Atualmente conservam-se os seus espaços mais importantes: a bateria, formada por uma ampla esplanada voltada para o mar, a casa-forte, pelo lado de terra, com compartimentos abobadados.




Pergunto-me a mim mesma, como é que é possível que um monumento com esta importância histórica esteja hoje sem uma placa sequer de identificação, pois a Ericeira é um local de muito turismo e o Forte facilmente visitável, por um caminho de terra.
Excelentíssimos senhores da Câmara de Mafra ou quem de direito: por favor, mandem fazer uma placa para este monumento e ponham-no bem visível. Não levem a mal, é um conselho de uma amiga da Ericeira e dos monumentos, mesmo dos esquecidos. 


terça-feira, 9 de abril de 2013

«Dança lenta» - anónimo


 A autora deste poema é uma jovem anónima italiana, doente terminal de cancro. Esse facto torna-o num poema único, que nos comove pela sua mensagem mas também pelas circunstâncias em que foi escrito.
Esta jovem, nos seus últimos dias de vida, preocupa-se com os outros seres humanos, fazendo-lhes um apelo: é preciso parar um pouco e aproveitar cada momento para gozar os pequenos prazeres da vida: ouvir o som da chuva, olhar o pôr do sol, dar atenção aos nossos filhos quando eles precisam dela...
A música não durará sempre!!! 

Ouçam este apelo e transmitam-no! Isso vai tornar esta jovem um pouco mais feliz, de certeza!




DANZA LENTA

Hai mai guardato i bambini in un girotondo ?
O ascoltato il rumore della pioggia
quando cade a terra?
O seguito mai lo svolazzare
irregolare di una farfalla ?
O osservato il sole allo
svanire della notte?
Faresti meglio a rallentare.
Non danzare così veloce.
Il tempo è breve.
La musica non durerà.
Percorri ogni giorno in volo ?
Quando dici "Come stai?"
ascolti la risposta?
Quando la giornata è finita
ti stendi sul tuo letto
con centinaia di questioni successive
che ti passano per la testa ?
Faresti meglio a rallentare.
Non danzare così veloce
Il tempo è breve.
La musica non durerà.
Hai mai detto a tuo figlio,
"lo faremo domani?"
senza notare nella fretta,
il suo dispiacere ?
Mai perso il contatto,
con una buona amicizia
che poi finita perché
tu non avevi mai avuto tempo
di chiamare e dire "Ciao" ?
Faresti meglio a rallentare.
Non danzare così veloce
Il tempo è breve.
La musica non durerà.
Quando corri cosi veloce
per giungere da qualche parte
ti perdi la metà del piacere di andarci.
Quando ti preoccupi e corri tutto
il giorno, come un regalo mai aperto . . .
gettato via.
La vita non è una corsa.
Prendila piano.
Ascolta la musicà.


 

sábado, 6 de abril de 2013

Olhos que são espelhos

  • Os olhos são o espelho da alma





«O silêncio» de Teolinda Gersão



O Silêncio (1981), de Teolinda Gersão (Coimbra, 1940), escritora e professora, foi um dos livros que reli nos últimos tempos e que gostei de reler.
Esta é, sem dúvida, uma autora que se dedica a uma escrita livre, que flui como o pensamento ou como as ondas do mar que vão e vêm ao sabor das luas, uma escrita de grande beleza natural.
Embora o título do livro seja O Silêncio, que nos faz lembrar a expressão «O silêncio é de ouro», só de verdadeiro alcance para alguns mais expeditos na arte do entendimento entre humanos, este é apenas uma das temáticas sobre que a autora quer falar. O silêncio é o do mar, que quase submerge a casa na falésia, o interior da casa e sua relação com as personagens, as flores e plantas, o jardim, a solidão.E nós, os leitores.
Um belo livro para ler ou reler. Este diálogo que se transcreve aqui, é tão real que me faz lembrar outros diálogos e outras palavras trocadas tantas vezes, numa praia ou noutro local qualquer.

 A revista de novo fechada, dobrada no cesto de vime, o relógio batendo, e não é nada disto que eu quero,
-recusar tudo e recomeçar de outra forma,
-mas não há outra forma possível,
-corpos que brevemente se entendem e de novo partem, soltos, separados,
-porque você recusa o real, você recusa,
-porque sempre sonhei viver de outro modo,
-mas só existe o real e é preciso resignar-se,
-mas quem vai definir o que é real,
 -o real é o contrário do  sonho,
-e se for o sonho que é real,
-está de novo mentindo ,
-a vida não se repete apenas, é possível uma súbita alteração qualitativa,
-a vida é uma coisa sem brecha, não há nunca rotura nem milagre,
-não sonhamos talvez o suficiente,
-é preciso parar de imaginar.
-Vou-me embora, disse-lhe, depois de uma pequena pausa.........


    



domingo, 10 de março de 2013

«Luna» de Isabel del Toro Gomes






Luna
A minha gata Luna
É meiga como uma pluma
De duas cores se enfeitou
É Lua é sol é estrela cadente
-Gata do mundo eu sou
Gata de toda a gente.