sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

«Fernando Pessoa, Plural como o Universo»


Retrato de Fernando Pessoa, por Almada Negreiros
 
Já consegui ver a exposição sobre Fernando Pessoa na Gulbenkian, domingo de manhã, nem havia fila para entrar, o que me surpreendeu. O local da exposição é um pouco labiríntico mas muito espaçoso, especialmente pensado para muitas pessoas poderem entrar e circular pelos diversos espaços, relativamente à vontade.
É uma exposição que surpreende pela grandeza e pelos belíssimos efeitos visuais, sonoros e mesmo tácteis. Uma exposição que requereu grandes meios de produção, que o nosso país irmão felizmente neste momento possui. Nós só temos que agradecer ao Brasil, em nome de Fernando Pessoa, que iria ficar «abismado» certamente, e de Portugal. 
Na famosa arca chamou-me a atenção as muitas marcas (redondas, possivelmente de objectos quentes) que ali ficaram assinaladas para a posteridade, testemunhos dos poucos recursos do escritor, que se serviria dela não só para guardar os seus escritos, como também para suporte ou quem sabe para mesa onde terá tomado algumas refeições.
Quanto ao novo acordo ortográfico, esta exposição é um bom local para se tirar algumas conclusões práticas. Os brasileiros continuam a escrever à sua maneira «heterônimos», com acento circunflexo. Nos papéis antigos que por lá se encontram lê-se «portuguêses», entre outras palavras que entretanto mudaram de grafia. Quem hoje se opõe a que a palavra «portuguêses» já não possua acento? Acho que ninguém, o que nos leva a concluir que toda esta polémica em volta do novo acordo não passa de mais uma «polémica» mesmo, com muita política à mistura, e que o tempo se encarregará de levar ou não em frente as mudanças que se impõem pelas necessidades dos  falantes.


                                     Começar de Almada Negreiros, Fundação Gulbenkian



Depois de ter recebido 250 mil visitantes em São Paulo, no Brasil, a exposição Fernando Pessoa, Plural como o Universo chega à Fundação Calouste Gulbenkian.

A exposição dedicada a Fernando Pessoa e aos seus heterónimos pretende mostrar toda a multiplicidade da obra do grande poeta português, conduzindo o visitante numa viagem sensorial pelo universo de Pessoa, para que leia, veja, sinta e ouça a materialidade das suas palavras.

Com curadoria de Carlos Felipe Moisés e Richard Zenith, nesta exposição podem encontrar-se poemas, textos, documentos, fotografias e pintura, bem como raridades tais como a primeira edição do livro Mensagem, com uma dedicatória escrita pelo poeta.

Horário: Terça a domingo entre as 10h00 e as 18h00.
Preços: €5.   (Aos domingos de manhã, é gratuito, aproveitem)!                                 




quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

«Lembranças de Salvador da Bahia» de Isabel del Toro Gomes

Para a Manuela e todos os meus primos da Bahia


                                          Lembranças de Salvador da Bahia





Em  Salvador da Bahia
Mergulha-se o corpo todo no passado
Feito de pedras antigas e gastas

De  ladeiras  onde uma imensa gente fervilha
No velho Pelourinho animado
Onde  tambores rufam infernais

Antecipando alegres carnavais





Em Salvador da Bahia
Vai-se entrando por todo o lado
Perscrutando todos os recantos

Como se estivéssemos 
Num mundo que nos pertence
Como se todo aquele encanto
Fizesse parte da gente 



Em Salvador da Bahia 

Dentro de nós há magia





Em Salvador da Bahia
Vai-se entrando pelos grandiosos portões
Das mil e uma igrejas de portas abertas
Olhos  nas  imagens resplandecentes

Na talha barroca nos muitos dourados
Nos tetos pinturas quadros jarras
Ouro e prata doutros tempos

Paredes e muros de azulejo português
Branco dos altares  e das bahianas
Santo António  São Domingos

Muitos Santos muitos Cristos
Nossas Senhoras e Virgens
E por fim Nosso Senhor do Bonfim
Decorado de mil fitinhas de todas as cores
Como as gentes de Salvador 




Em Salvador da Bahia
Os dias são abafados, mornos
As noites quentes e há festivais
Todo o mundo tocando e cantando
No meio da multidão nos botecos
Nas ruas vende-se de tudo
Acarajé batapá picolé de tapioca
Latões sorvetes cocos aos montões
Matando a nossa  sede insaciável  de mais e mais



Em  Salvador da Bahia
Assiste-se  com devoção  ao pôr do sol
No Farol  da Barra
O Sol que se despede no mar
Da Baía de Todos os Santos
Ali é o lugar dos adoradores do sol.
Do começar e do acabar



Naquela terra de Salvador
Que acolheu os nossos antepassados

Ficamos exaustos, corpos  suados
Deslumbra-nos o azul do céu e do mar 
Do outro lado do Equador
Comemos banana de água, goiaba, mamão,
Maracujá, sapota, eu sei lá
Vemos dançar capoeira 
Ouvimos o som do berimbau
E voltamos de lá metade  bahianos


Que saudades

Eu parti eles ficaram
Naquela  terra de contrastes
De tristezas e de alegrias.