quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

«Os convencidos da vida» de Alexandre O'Neil

 Hoje é dia para, ao contrário do que é costume, apresentar aqui as prosas de um poeta. Afinal, os poetas são pessoas como as outras, até escrevem em prosa por vezes e muito bem. É o caso de Alexandre O' Neil (1924-1986), um dos fundadores do Movimento Surrealista de Lisboa, mais conhecido pela sua produção poética, mas que tem alguns livros dignos de interesse em que se reúnem os textos que ele ia publicando na imprensa. É o caso de As andorinhas não têm restaurante (1970) e Uma coisa em forma de assim (1981). Foi deste último, que reúne textos escritos ao longo da década de 60, 70 e 80, saídos no Diário de Lisboa, Diário Popular, A Capital, Flama, A Luta e Jornal de Letras, que retirei o excerto que se segue.
Trata-se se uma sátira sobre aquelas pessoas que proliferam desde sempre na nossa sociedade e nas nossas vidas e uma paródia à expressão «Os vencidos da vida», de significado muito diferente. Continua a ser um texto de grande atualidade, já que os valores da «honestidade», «honra», «modéstia», etc, se encontram francamente em vias de extinção.


Todos os dias os encontro. Às vezes sou obrigado a escutá-los, a dialogar com eles. Já não me confrangem. Contam-me vitórias. Querem vencer, querem, convencidos, convencer. Vençam lá, à vontade. Sobretudo, vençam sem me chatear.
Mas também os aturo por escrito. No livro, no jornal. Romancistas, poetas, ensaístas, críticos (de cinema, meu Deus,de cinema!) Será que voltaram os polígrafos? Voltaram, pois, e em força!
Convencidos da vida há-os, afinal, por toda a parte, em todos (e por todos) os meios. Eles estão convictos da sua excelência, da excelência das suas obras e manobras (as obras justificam as manobras), de que podem ser, se ainda não são, os melhores, os mais em vista.

                  Alexandre O' Neil, in Uma coisa em forma de assim

domingo, 27 de novembro de 2011

O Cão e o dono desaparecido



O Cão e o dono desaparecido

Que ser humano seria capaz de esperar
Tão fiel e persistente
Pelo seu bicho de estimação
Na rua ao calor à chuva e ao vento
Noite e dia, sem dali arredar
Como este pequeno exemplo
De amor teimosia e paixão
Espera pelo seu dono
Que não pode já regressar?

Que ser humano seria capaz
De ser tão fiel a outro ser
Ficando ali à sua espera
Até sempre, até morrer?
Nenhum, esta é a sabedoria do cão!



sexta-feira, 18 de novembro de 2011

«Oh, não ames demasiado tempo» de W.B.Yeats




William Butler Yeats, muitas vezes apenas designado por W.B. Yeats,  nasceu em Dublin em 1865 e morreu em 1939, em França. Foi um poeta, dramaturgo e místico irlandês.
Vastamente reconhecido como um dos expoentes da poesia do séc. XX, Yeats nasceu em Dublin, onde se desenvolveu num meio culto e criativo. O seu pai foi o pintor John Butler Yeats. William também estudou arte, tanto em Dublin como em Londres. Durante as férias, a sua família costumava visitar Sligo, na região Oeste da Irlanda. As ricas tradições e as lendas do lugar influenciaram fortemente o poeta por toda a vida.
Foi galardoado com o Nobel da Literatura em 1923.

Quadro do pai de W.B.Yeats

Selecionei este poema, duma simplicidade e dum misticismo que me deslumbram.

Oh, não ames demasiado tempo


Amada, não ames demasiado tempo;
Eu amei tanto, tanto
E fui passando de moda
Como uma velha canção.

Ao longo desses anos da nossa juventude
Não podíamos distinguir
O nosso pensamento do pensamento alheio
Porque tão unidos éramos apenas um.

Mas em breve, breve instante ela mudou -
Oh, não ames demasiado tempo
Ou irás passando de moda
Como uma velha canção.


                                        W.B. Yeats, In The seven Woods (1904)