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terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

«Canção do lago secando» de Políbio Gomes dos Santos



Poeta quase desconhecido da maioria de nós, Políbio Gomes dos Santos nasceu em Ansião, em 1911, onde morreu com apenas 28 anos , vítima de tuberculose, implacável doença que vitimou tanta gente nos séculos XIX e XX.
Homem de raras qualidades, membro da academia coimbrã onde exerceu vários cargos directivos, fez parte do grupo do Novo Cancioneiro. Da sua poesia só ficaram duas obras, As três Pessoas (1938) e Voz que Escuta (1944). Na realidade, embora prometedor, o autor não teve tempo de libertar-se dos moldes«presencistas», ainda em voga.
Impressiou-me nele, em última instância, o seu lirismo impregnado  da dor de quem sabe que vai morrer, de quem não pode escapar ao seu destino fatal e injusto. Como neste poema:

Cancão do Lago Secando

Pela noite da minha trágica aventura,
Meu sofrimento é o achado que afago,
Se acordado, sofrendo,
E se a dormir, sonhando
Que sou lago.

Adeus, ó canas, cá me vou secando!
À míngua de nascente eu parto evaporado
Sem me ver partir!

Ainda se os que passam pudessem beber-me
Sem tornarem a passar
Pra maldizer-me...

Ainda se a menina reclinada à minha beira,
Que tanto e tanto me seduz ainda,
Viesse banhar-se
E depois se afogasse em mim, violada e linda...

Ainda se eu,
Profundo e vasto e longo,
Pudesse ter no mapa mancha azul e portos
E ser útil à navegação...

Finando-me abriria a justa e verdadeira cova
À minha sede e à minha direcção.

                                     in «Voz que Escuta»