Mostrar mensagens com a etiqueta Jorge Barbosa. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Jorge Barbosa. Mostrar todas as mensagens

domingo, 19 de setembro de 2010

Jorge Barbosa

Jorge Barbosa, poeta cabo-verdiano (1902-1971), quase desconhecido entre nós, deu a conhecer a tragédia humana das populações de Cabo-Verde nos seus poemas. Escolhi este poema por ser uma descrição perfeita, cheia de realismo, duma cena da vida quotidiana.

Ilha
Quando o barco alemão vem à ilha carregar sal
há um sobressalto íntimo de contentamento
na gente que fica a ver de terra.

À varanda da antiga casa do largo
olhos curiosos em direcção ao mar
atravessam as lentes baças
de velho binóculo do tempo dos piratas.


Toma certo ar garboso e oficial
com a bandeira nacional à popa
o escaler a remos
ao partir apressado ao vapor
com as autoridades todas do porto
e o empregado da firma carregadora
que leva uma grande pasta sob o braço...

Compram-se a bordo novidades
ouvem-se notícias de longe...
bebe-se
cerveja gelada...

O barco parte depois
e a Povoação resignada
retoma a monotonia habitual...

...à noitinha
à hora tagarela de em seguida ao jantar
os homens reúnem-se na rua principal
comentando as ocorrências do dia.

Vem então à baila aquela passageira de boca pintada
que seguia para o Congo Belga...
E da evocação da mulher estrangeira
ficou um sonho parado
em cada um...
                                (in Ambiente)