sábado, 27 de julho de 2013

«Não me peças sorrisos» de Agostinho Neto

Agostinho Neto e sua mulher, Maria Eugénia
 
Agostinho Neto (1922/1979)

Relembrando Agostinho Neto, que também foi poeta.


Não me peças sorrisos


Não me exijas glórias que ainda transpiro
os ais
dos feridos nas batalhas

Não me exijas glórias
que sou eu o soldado desconhecido
da Humanidade

As honras cabem aos generais
A minha glória
é tudo o que padeço
e que sofri
Os meus sorrisos
tudo o que chorei

Nem sorrisos nem glória
Apenas um rosto duro
de quem constrói a estrada
por que há-de caminhar
pedra após pedra
em terreno difícil

Um rosto triste
pelo tanto esforço perdido
-esforço dos tenazes que se cansam
à tarde
depois do trabalho

Uma cabeça sem louros
porque não me encontro por ora
no catálogo das glórias humanas

Não me descobri na vida
e selvas desbravadas
escondem os caminhos
por que hei-de passar

Mas hei-de encontrá-los
e segui-los
seja qual for o preço

Então 
num novo catálogo
mostrar-te-ei o meu rosto
coroado de ramos de palmeira

E terei para ti
os sorrisos que me pedes.

                                                     Agostinho Neto

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