sábado, 31 de dezembro de 2011

...Ano de 2012



Só escrevo ... Ano de 2012.
Falta lá o adjetivo Feliz, pois não faz sentido estar a escrevê-lo.
Sabemos que não vai ser um ano feliz, mas vai ser um ano. Melhor ou pior, é um ano de qualquer maneira, os seja, 366 dias, que vamos ter de ir vivendo, um a um, e isso é uma 

grande felicidade

Alguns não tiveram a oportunidade de chegar até aqui, ficaram pelo caminho. Por isso, somos uns sortudos.

Por isso, vivamos o ano de 2012 e isso basta!
Com amizade


Isabel del Toro Gomes


quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

«Cesária Évora» de José Manuel Simões

 

Ao ler a biografia de Cesária Évora, recentemente falecida, procuro  informações sobre esta misteriosa mulher, que me limitava a ouvir maravilhada, esquecendo-me então de perguntar quem seria a dona de tão melodiosa voz, o que estaria por trás das suas feições tristes e duras, quem era ela de facto. 
Este é um pequeno livro de 94 páginas, uma pequena e única biografia de Cesária, escrita por José Manuel Simões, que a entrevistou um dia, com algumas dificuldades de empatia, de início. Talvez agora, com o desaparecimento da Diva dos Pés Descalços (porque não aguentava mesmo os sapatos duros), surjam outros livros sobre a sua vida. Esta serve, no entanto,  para a conhecermos minimamente, para compreendermos a sua difícil ascensão aos grandes palcos, o seu percurso de vida de menina pobre do Mindelo, filha de um tocador de rua de violino e de uma ótima cozinheira em casa de brancos ricos. Órfã de pai aos sete anos, com sete irmãos (o número mágico «sete» talvez a tenha fadado), o seu destino era cantar e ajudar assim a sustentar a família e os filhos, mais tarde, como mãe solteira, destino da maior parte das mulheres de Cabo-Verde, que vêem os seus homens partir para longe. Ela assim pensou sempre, dizendo que levaria «a sua cruz até ao fim».

Afinal, a dor e a tristeza das mornas que cantava mais não eram que a própria dor e tristeza que lhe iam na alma, herança do sofrimento daquele povo a que pertencia.

A dor das mornas

Canta as mornas e as coladeira com uma voz dilacerada que reflete sofrimento. Com sublime mistério, em melodias suaves e ondulantes, mistura os ritmos de África, o sentimento dos blues e a saudade do fado.
Quem a ouve não fica indiferente. O amor, a tristeza, a esperança e até mesmo a alegria momentâneas são cantadas com melancolia, profunda e permanente, que emana da sua personalidade, ausente e distraída. Canta com o sentimento de alguém que resiste a todas as provas, alguém que se sente marcado pelo passado sofrido, o seu, e o de seu país, vitimado por ciclos de secas, emigração massiva e esperança num futuro melhor que sempre tardou em chegar.
É a rainha da morna, género fundamental, mais culto e mais antigo, da mistura de culturas que ao longo dos séculos marcaram Cabo Verde. Desde os anos 30 que essas melodias suaves e ondulantes acompanham a história do arquipélago, contando sensações complexas com simplicidade. Canto nostálgico possuído pela terra mítica. Dor de escravo que tão bem cantou em Sodade, tema que lhe abriu as portas do sucesso internacional e que retrata a deportação forçada de trabalhadores para a Ilha de S. Tomé e Príncipe, golfo da Guiné ou Angola. Prática herdada da escravatura e levada a cabo pelo Estado Novo. Entre 1950 e 1970, o Governo português enviou mais de 30.000 cabo-verdianos para outras colónias.

                                Cesária Évora, de José Manuel Simões
Pena é que tenha sido desta forma dramática e terrível que nós, portugueses, participámos para a história da criação das mornas e doutras  formas artísticas.