domingo, 27 de novembro de 2011

O Cão e o dono desaparecido



O Cão e o dono desaparecido

Que ser humano seria capaz de esperar
Tão fiel e persistente
Pelo seu bicho de estimação
Na rua ao calor à chuva e ao vento
Noite e dia, sem dali arredar
Como este pequeno exemplo
De amor teimosia e paixão
Espera pelo seu dono
Que não pode já regressar?

Que ser humano seria capaz
De ser tão fiel a outro ser
Ficando ali à sua espera
Até sempre, até morrer?
Nenhum, esta é a sabedoria do cão!



sexta-feira, 18 de novembro de 2011

«Oh, não ames demasiado tempo» de W.B.Yeats




William Butler Yeats, muitas vezes apenas designado por W.B. Yeats,  nasceu em Dublin em 1865 e morreu em 1939, em França. Foi um poeta, dramaturgo e místico irlandês.
Vastamente reconhecido como um dos expoentes da poesia do séc. XX, Yeats nasceu em Dublin, onde se desenvolveu num meio culto e criativo. O seu pai foi o pintor John Butler Yeats. William também estudou arte, tanto em Dublin como em Londres. Durante as férias, a sua família costumava visitar Sligo, na região Oeste da Irlanda. As ricas tradições e as lendas do lugar influenciaram fortemente o poeta por toda a vida.
Foi galardoado com o Nobel da Literatura em 1923.

Quadro do pai de W.B.Yeats

Selecionei este poema, duma simplicidade e dum misticismo que me deslumbram.

Oh, não ames demasiado tempo


Amada, não ames demasiado tempo;
Eu amei tanto, tanto
E fui passando de moda
Como uma velha canção.

Ao longo desses anos da nossa juventude
Não podíamos distinguir
O nosso pensamento do pensamento alheio
Porque tão unidos éramos apenas um.

Mas em breve, breve instante ela mudou -
Oh, não ames demasiado tempo
Ou irás passando de moda
Como uma velha canção.


                                        W.B. Yeats, In The seven Woods (1904)

 

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

«A um jovem poeta» de Manuel António Pina



Manuel António Pina é um dos nossos mais importantes poetas e autores de livros para crianças e jovens. Com 66 anos, foi galardoado com o prémio Camões 2011. É também jornalista e  cronista do Jornal de Notícias e da Notícias Magazine. É ainda autor de peças de teatro e de livros de ficção.
Aqui fica um dos seus poemas, a todos os jovens poetas:

A um Jovem Poeta

Procura a rosa.
Onde ela estiver
estás tu fora
de ti. Procura-a em prosa, pode ser

que em prosa ela floresça
ainda, sob tanta
metáfora; pode ser, e que quando
nela te vires te reconheças

como diante de uma infância
inicial não embaciada
de nenhuma palavra
e nenhuma lembrança.

Talvez possas então
escrever sem porquê,
evidência de novo da Razão
e passagem para o que não se vê.

                           
Manuel António Pina, in "Nenhuma Palavra e Nenhuma Lembrança"

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

«Toda a Terra...»


João José Cochofel nasceu em Coimbra em 1919 e morreu em 1982, na mesma cidade.
Licenciou-se em Coimbra em Ciências Histórico-Filosóficas, foi um dos membros mais representativos do movimento neorrealista coimbrão, concretizado no Novo Cancioneiro, foi crítico literário e também musical, mais tarde, em Lisboa.
O seu lirismo é intimista e delicado, de expressão simples e segura, com um estilo muito pessoal e de refinada sofisticação, pouco habitual nos neorrealistas.
Escolhi este poema, entre muitos que me agradavam:


Toda a Terra...
Toda a terra é
boa para viver
um outono doce
cor de liberdade,

do sol e do vento,
dos lumes da noite,
de tudo que é bom
ter por companhia,

tudo que afugente
este pesadelo
de envelhecer

com as mãos vazias
do peso secreto
de outras mãos nas minhas.


                                          João José Cochofel, in Quatro Andamentos(1966)



domingo, 6 de novembro de 2011

«Poesia» de Isabel del Toro Gomes




Poesia

Como pode alguém pensar

Ou sequer suspeitar

Que a poesia

Não tem futuro?

o futuro é a poesia ela própria.



Quando escrevo um poema

Estou só no mundo a pairar

as palavras e eu

Que dizem tudo por mim

Nada mais conta.



Quando leio um poema

É como se lesse assim

Milhões de livros

Árvores que meditam e se desfolham

Que Me oferecem o fruto maduro

Nada mais interessa.



A poesia somos todos nós

Quando olhamos os outros

E mesmo sem os amar

Os amamos com dor ou pena

E nada mais conta.

É claro que a poesia tem futuro

A poesia é o futuro.